CRÔNICA DA SEMANA
A JUVENTUDE E A ANTIGÜIDADE
(Por Cairbar Garcia Rodrigues)
Sou antigo, sabem? Notem que eu disse antigo, não antiquado. E também não estou afirmando que sou velho, pois não sou. O fato é que penso e ajo de uma maneira um pouco diversa de outras pessoas da mesma idade. E é por aqui que começa minha Antigüidade, muito paradoxal, por sinal. Gosto das coisas de algumas décadas passadas que vão lá longe, no tempo, quando comecei a compreender-me como gente. Mas, por outro lado, estou sempre ancorado, na juventude, nos adolescentes e até mesmo nas crianças. Eles me ensinam um modo de vida que eu sei que levam, mas que na cabeça deles é um pouco diferente do que realmente é. E eles sempre me surpreendem. Quando arranho no meu violão algumas velhas músicas do passado ou alguma música caipira de raiz que canto um bocado mal, não nego, ficam ouvindo atentamente, pensativos, como se entrassem num “admirável mundo novo”, que é, na verdade, um admirável mundo velho. Quando lhes falos dos cinemas de duas mil e quinhentas poltronas de couro, amplas, onde cabiam até duas pessoas magras. que havia na minha e em outras cidades, eles ficam atônitos. Mas isso tanto é verdade que um desses cinemas de Rio Preto, quando perdeu de vez a guerra para os bares e a TV foi tombado e logo transformado num grande shopping, bem no miolo central da cidade. Sua fachada, em estilo art déco, foi mantida e ainda construída uma outra idêntica, na rua dos fundos, onde era o fundo do grande cinema, numa extensão exata de cem metros, atravessando o quarteirão por inteiro. Se lhes digo que a cidade era toda de paralelepípedos (alguns nem conhecem tal “palavrão”), percebo que a imaginação deles voa para um tempo que jamais viverão. Falo-lhes, também, dos circos mambembes, com teatro e bons palhaços, dos pequenos parques de diversões, onde os jovens faziam footing e ofereciam músicas a determinadas pessoas que queriam conquistar, através de um precário serviço de alto-falantes. Geralmente o agraciado com a oferenda era descrito pelas roupas, pela estatura, cor dos cabelos, etc. Digo-lhes como eram as escolas públicas no meu tempo de criança, infinitamente superiores em qualidade. Escolas particulares somente as de padres ou de freiras, que tinham que ser complementadas com aulas particulares, embora fossem caras, muito caras. Comento sobre os velhos jornais impressos em branco e preto, uma impressão quase artesanal, exceto as pesadas e barulhentas rotativas, que necessitavam de manutenção quase diária, muitas delas quebrando várias vezes o papel jornal de má qualidade das grossas e pesadas bobinas. Por fim termino, entre tantas outras coisas, falando do leite vendido sem pasteurização, em gordinhas garrafas de vidro de gargalo largo, com muito duvidosas condições de higiene. E ninguém morria por isso. Ou morria? Eu não sei. Era ainda muito menino. E naquele tempo se morria por qualquer coisa. Menos por obesidade, diabetes e outras coisas referentes à alimentação farta e rica em carboidratos e gorduras. Os fast food… o que seria isso?
Mas, para encerrar, de uma coisa estou certo: mesmo vivendo menos, trabalhando mais e sem os confortos da modernidade, as pessoas eram muito mais felizes. E quanto aos jovens e adolescentes com os quais converso, falam muito pouco. Eles não têm histórias próprias de vida, pois não têm vida própria. Vivem somente do massacre dos Harry Potter, dos games da informática, do álcool precoce e, quase sempre, das drogas. Um pena! Jovens doces e dóceis, fáceis de lidar e de conviver, estragados pela globalização capitalista ocidental, que os tornou semi-andróides.
terça-feira, 23 de dezembro de 2008
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