O MELHOR DA POESIA BRASILEIRA
DESEJO
(Casimiro de Abreu)
Se eu soubesse que no
mundo
Existia um coração,
Que só por mim
palpitasse
De amor em terna
expansão;
Do peito calara as
mágoas,
Bem feliz eu era então!
Se essa mulher fosse
linda
Como os anjos lindos
são,
Se tivesse quinze anos,
Se fosse rosa em botão,
Se inda brincasse inocente
Descuidosa no gazão;
Se tivesse a tez
morena,
Os olhos com expressão,
Negros, negros, que
matassem,
Que morressem de
paixão,
Impondo sempre tiranos
Um jugo de sedução;
Se as tranças fossem
escuras,
Lá castanhas é que não,
E que caíssem formosas
Ao sopro da viração,
Sobre uns ombros
torneados,
Em amável confusão;
Se a fronte pura e
serena
Brilhasse d'inspiração,
Se o tronco fosse
flexível
Como a rama do chorão,
Se tivesse os lábios
rubros,
Pé pequeno e linda mão;
Se a voz fosse harmoniosa
Como d'harpa a
vibração,
Suave como a da rola
Que geme na solidão,
Apaixonada e sentida
Como do bardo a canção;
E se o peito lhe
ondulasse
Em suave ondulação,
Ocultando em brancas
vestes
Na mais branda comoção
Tesouros de seios
virgens,
Dois pomos de tentação;
E se essa mulher
formosa
Que me aparece em
visão,
Possuísse uma alma
ardente,
Fosse de amor um
vulcão;
Por ela tudo daria...
— A vida, o céu, a
razão!
DESCRIÇÃO DA CIDADE DE SERGIPE D'EL-REI
(Gregório de Matos)
Três dúzias de casebres remendados,
Seis becos, de mentrastos entupidos,
Quinze soldados, rotos e despidos,
Doze porcos na praça bem criados.
Dois conventos, seis frades, três letrados,
Um juiz, com bigodes, sem ouvidos,
Três presos de piolhos carcomidos,
Por comer dois meirinhos esfaimados.
As damas com sapatos de baeta,
Palmilha de tamanca como frade,
Saia de chita, cinta de raqueta.
O feijão, que só faz ventosidade
Farinha de pipoca, pão que greta,
De Sergipe d'El-Rei esta é a cidade.
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