quinta-feira, 9 de setembro de 2010

CRÔNICA DA SEMANA

RUPTURA E CONTINUIDADE
(Fernanda Pinho)

Faz nove anos desde que eu saí do colégio e, naturalmente, muitos dos conceitos que aprendi ali ficaram esquecidos ou estão guardados em algum lugar da minha memória que não acesso nunca. Há ainda as poucas coisas das quais nunca me esqueci e aquelas que só fizeram sentido quando cheguei a este ponto ao qual convencionamos chamar de vida adulta. Aliás, acho “vida adulta” um conceito muito vago e talvez eu devesse escrever sobre isso um dia. Um dia que não é hoje, pois hoje quero falar sobre outra coisa.
Hoje quero falar sobre a aula de História do professor Cleiton, que nunca se limitou a nos fazer decorar datas e fatos e, portanto, nos ensinou muitas coisas que eu só compreendi agora que sou... adulta (é, detesto admitir). Cleiton gostava de provocar a reflexão e incitar o debate. Ingênuos que éramos, poucas vezes mordíamos a isca. Mas me lembro muito bem dele – não raramente – escrever essas duas palavrinhas no quadro e nos fazer pensar sobre elas: ruptura e continuidade. Sob o prisma da sua disciplina, ele queria nos fazer identificar momentos da história da humanidade em que, diante da possibilidade de escolha, os homens optaram por romper ou continuar. Mesmo sem entender exatamente o porquê, eu conseguia observar que quando a opção era pela ruptura, a longo prazo, os resultados eram melhores para a sociedade. Chega a ser óbvio, afinal, se chegamos a uma situação onde é necessário fazer uma escolha, é porque as coisas não vão tão bem assim. E se não está tão bem, por que continuar? Porque continuar é mais fácil. Não existe ruptura sem caos, e poucos são aqueles interessados em revoluções de qualquer ordem.
Me saí muito bem nas provas do Cleiton, mas o que só entendi anos mais tarde é que esse negócio de ruptura e continuidade são conceitos determinantes para a história do mundo, para a história do nosso país (pra isso que existe eleição) e para a nossa própria história. Descobri que quanto maior é nossa capacidade de romper, maior é o nosso potencial de felicidade. Por que existem pessoas que passam anos trabalhando numa empresa que não suportam, anos vivendo um casamento infeliz, anos cercado por pessoas em quem não confiam? Simplesmente porque não têm coragem de provocar ruptura. E dá para entender. Romper dói demais e falo por mim que tenho pensando no assunto desde que, pela primeira vez na minha vida, provoquei uma ruptura. Por minha conta, sem tentar saber o que se passava com o outro. Eu estava numa situação que me fazia mal, eu estava sofrendo. Então, como num loop de montanha-russa, eu fechei o olho e fui. E vou dizer pra vocês: a vertigem é das brabas. Não é fácil suportar as consequências de uma ruptura que você mesmo provocou. Ainda não me recuperei do caos, mas sei que é daí que virá a ordem. A tristeza hoje tem um latifúndio na minha alma, mas, paradoxalmente, sinto um orgulho imenso por ter-me feito esse favor. Antes agora do que depois. E recomendo: experimente romper você também. Rompa com a má vontade, com o desrespeito e com o desamor. Rompa com a solidão a dois, com o chefe intransigente e com o amigo da onça. Rompa com o cartão de crédito, com a balança e com a tecnologia. Rompa com as más notícias, com a fofoca e com suas deduções.
Rompa, porque como diz uma frase que li outro dia, e que resume tudo isso o que eu precisei de tantas frases pra dizer: “Não existe prova maior de insanidade do que fazer a mesma coisa, dia após dia, e esperar resultados diferentes”.

Fonte: Crônica do Dia

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