quarta-feira, 13 de junho de 2012

O MELHOR DA POESIA BRASILEIRA

SOLITÁRIO
(Augusto dos Anjos)

Como um fantasma que se refugia 
Na solidão da natureza morta, 
Por trás dos ermos túmulos, um dia, 
Eu fui refugiar-me à tua porta!

Fazia frio e o frio que fazia
Não era esse que a carne nos contorta...
Cortava assim como em carniçaria
O aço das facas incisivas corta!

Mas tu não vieste ver minha Desgraça!
E eu saí, como quem tudo repele, 
-- Velho caixão a carregar destroços –

Levando apenas na tumba carcaça
O pergaminho singular da pele
E o chocalho fatídico dos ossos!


UM CLOWN DE SHAKESPEARE
(Lucia Pereira Bezerra)

Se ontem eu me desfiz
E hoje, por acaso,
Eu me desfaço,
É que não trago
No rosto verniz
Tampouco maquilagem
De palhaço.

Não trago no meu peito
Um órgão fechado
E de aço
De tamanho tal e tal jeito
Que se atrasa ou se apresse
Que, assim, parece que é feito
De algum tipo de poliéster
Ou um outro tipo de plástico.

Se ontem eu desapareci
Eu hoje não mais me acho
É que em meu rosto cansado
Tem uma máscara a cair,
Um rio efêmero a fluir
Ou quem sabe um riacho.

Não.
Meu coração é um rio fantástico,
Caudaloso e que, acreditem, quase sorri;
Similar a pequenos e numerosos pássaros,
No espaço, sem saber o caminho a seguir.

Meu coração é um clown de Shakespeare
Em uma armadura de tarlatana e titânio.
Meu coração é de um poeta-mecânico,
Dono do meu destino e Senhor de mim.

Por isso ontem me desfiz
E hoje me desfaço:
É que não trago
No rosto verniz
Tampouco maquilagem
De palhaço

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