quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

O MELHOR DA POESIA BRASILEIRA E UNIVERSAL

DELÍRIO
(Olavo Bilac)

Nua, mas para o amor não cabe o pejo
Na minha a sua boca eu comprimia.
E, em frêmitos carnais, ela dizia:
- Mais abaixo, meu bem, quero o teu beijo!

Na inconsciência bruta do meu desejo
Fremente, a minha boca obedecia,
E os seus seios, tão rígidos mordia,
Fazendo-a arrepiar em doce arpejo.

Em suspiros de gozos infinitos
Disse-me ela, ainda quase em grito:
- Mais abaixo, meu bem! – num frenesi.

No seu ventre pousei a minha boca,
- Mais abaixo, meu bem! – disse ela, louca,
Moralistas, perdoai! Obedeci…


ABDICAÇÃO
(Fernando Pessoa)

Toma-me, ó noite eterna, nos teus braços
E chama-me teu filho. Eu sou um rei
que voluntariamente abandonei
O meu trono de sonhos e cansaços.

Minha espada, pesada a braços lassos,
Em mão viris e calmas entreguei;
E meu cetro e coroa — eu os deixei
Na antecâmara, feitos em pedaços.

Minha cota de malha, tão inútil,
Minhas esporas de um tinir tão fútil,
Deixei-as pela fria escadaria.

Despi a realeza, corpo e alma,
E regressei à noite antiga e calma
Como a paisagem ao morrer do dia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário