terça-feira, 4 de agosto de 2009

CRÔNICA DA SEMANA


AMOR EM NÚMEROS
(Eduardo Loureiro Jr.)

Às vezes, a gente quer tanto o DEZ que faz pouco do SETE.
O SETE está acima da média, e muitos o consideram um bom partido, a perfeição dentro do possível. Deve até ter muita gente de olho grande no nosso SETE, mas é irresistível pensar que, se conseguimos um SETE, podemos conseguir coisa ainda melhor.
O OITO, por exemplo, é melhor que o SETE. Infinitamente melhor -- quando deitado. O OITO é sedutor, sabe as curvas, os desvios, os atalhos. Mas, assim como sabe chegar, também sabe partir, e ficamos desconfiados. O OITO é bom para dar uma animada, para sacudir a poeira, não para um comprometimento sério.
Já o NOVE está quase lá. Está tão quase lá que a gente suspeita. Ou é muito marketing, muita fachada, ou, pior, o NOVE é preguiçoso. Sim, porque como pode estar tão pertinho do DEZ e não ser DEZ? O NOVE nos dá aquela sensação de que vai criar barriga, de que vai se acomodar, de que noves fora, nada.
Na falta do DEZ -- e do que fazer -- a gente, só por curiosidade, fica a ver e pensar nos outros. SEIS e CINCO, por exemplo, os medianos. Aqueles que quase todo mundo tem em casa: os que trabalham oito horas por dia, os que roncam, os que veem novela e assistem ao futebol. Sim, eles são necessários para o equilíbrio da sociedade. Não são bons o suficiente para a gente, mas têm lá sua utilidade.
Já o QUATRO e o TRÊS são desprezíveis, os reprovados. São, no mínimo, irresponsáveis. Em alguns casos, desleais ou até mesmo cafajestes. São o aluno que cola, o sonso infiel. É incrível como há quem os queira, às vezes até uns amigos nossos. Mas na nossa casa não entram, a não ser pelas notícias trágicas dos telejornais ou pela boataria da fofoca.
Só não sejamos muito duros com o DOIS e o UM. Eles são os coitadinhos, as vítimas do sistema, os excluídos, os fracos. Enquanto o DEZ não vem -- e parece que o DEZ nunca vem --, a gente se permite fazer uma caridade, acolher um DOIS, ou até mesmo um UM, confortá-lo, reabilitá-lo, salvá-lo. Afinal, nós somos bons, e os bons praticam a boa ação.
E então -- ou porque estamos cansados, ou frustrados, ou apenas distraídos -- topamos com o ZERO: a tela branca e vazia. Em si, o ZERO é nulo, mas, colocado ali ao nosso lado, recebe toda a nossa projeção de grandeza e adquire ares de dezena. Iludimo-nos que seja o DEZ e, quando nos desiludimos, racionalizamos que é melhor ainda que o DEZ porque é humilde, porque não resiste, porque aceita em nós tudo que rejeitamos em todos.
E quase nunca nos perguntamos qual é o nosso número.

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