terça-feira, 11 de novembro de 2008

RESENHA LITERÁRIA


DOM QUIXOTE
(Miguel de Cervantes)

Desde sua publicação, no Renascimento, Dom Quixote tem se mantido como uma das fontes de inspiração e de referência dos escritores e artistas de todas as épocas. A figura de Dom Quixote se tornou por si mesma num símbolo do artista moderno em suas lutas contra as agruras de urna realidade desencantada. Satirizando o declínio dos valores aristocráticos, representados pelas gestas cavaleirescas medievais, Cervantes não só anuncia os impasses da cultura moderna nascente, quanto denuncia o esvaziamento da fantasia e do idealismo num mundo cada vez mais submetido aos rigores da razão prática e dos interesses materiais. Nesse sentido, Dom Quixote se impõe como uma das matrizes básicas de toda a literatura moderna. Ver O Rei Artur e os cavaleiros da Távola Redonda.
Nesse romance épico há referências às lutas da nobreza hispânica para expulsar os árabes, que invadiram e se instalaram na Península Ibérica. Esse longo processo, conhecido como a Guerra da Reconquista, transcorreu durante a Idade Média, assinalando a mentalidade militar e cavalheiresca da aristocracia ibérica, e repercutindo na cultura medieval como um todo. Ver El Cid. E sua conclusão propiciou a constituição do Estado espanhol como uma monarquia centralizada, o que por sua vez seria a condição indispensável para o seu pioneirismo nas Grandes Navegações e para a introdução do país na modernidade e nos valores do Renascimento. Com sua obra, Cervantes pretendia expor e criticar justamente a forte presença da tradição aristocrática medieval na cultura espanhola, derivando daí as dificuldades que o país encontrava para adaptar-se ao mundo e à cultura modernos.
O conflito entre o idealismo repleto de delírios e fantasias de Dom Quixote e o realismo prático e rasteiro de Sancho Pança comporta um dos mais nítidos vislumbres do confronto de valores que acompanhou a emergência do pensamento moderno. Nesse sentido, o livro de Cervantes mantém uma viva atualidade, permitindo comparar, desde então até nossos dias, os níveis do desencontro entre uma visão generosa, sublime e heróica do mundo, e outra voltada para os interesses mais imediatos e comezinhos, para os pensamentos mais convencionais e as atitudes mais convenientes.

(Fonte: www.portrasdasletras.com.br)

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