terça-feira, 11 de outubro de 2011

CRÔNICA DA SEMANA
QUERO SER PEQUENO
(Ruleandson do Carmo)

Eu descobri que não era mais criança no dia em que meu pai veio me visitar e eu estava triste. Pedi a ele: "Pai, posso sentar no seu colo?" e já fui sentando. Nunca esqueci o olhar dele. Parecia ter visto a pior aberração do mundo, a mais assustadora de todas as criaturas, ali, ao vivo, à frente dele e sentado em seu colo. Minha mãe disse "ele está carente". Acho que nada machuca mais do que alguém ter que explicar a quem você pede carinho que você precisa de atenção. Não culpo meu pai. Ele nunca teve um. E com a idade que eu tinha acho que ele esperava que o filho triste o convidasse para tomar uma cerveja no bar da esquina e não pedisse um cafuné sentado em seu colo.
Corri para o meu quarto e peguei meu urso azul de pelúcia. A pelúcia não era azul, mas ele era. Sempre gostei de azul. Eu olhei para o meu urso e ele não me reconheceu. Ele pertencia à criança que todas as noites o desejava "boa noite" e ficava torcendo para ele ganhar vida enquanto fingia que dormia. Ele era daquela criança, não meu. Foi então que eu percebi que havia uma lacuna, entre quem eu achava que era e quem eu havia me tornado. Brigadeiro não podia mais ser meu prato favorito, e nem "Vou de táxi" a canção da minha vida e eu teria que achar uma atriz melhor do que a Priscila da TV Colosso.
Tive que crescer sem ninguém perguntar se eu queria e muito menos me ensinar como seria. Nunca, nada me doeu tanto quanto crescer. Trocaram minhas figurinhas de chicletes por contas a pagar, meu celular de borracha que tocava músicas foi substituído por vozes que me lembram dos meus compromissos, meu relógio de plástico que sequer marcava as horas me mostra a todo momento que o tempo passou. Não posso mais nem ir aonde eu quero. Antes, me bastava um barquinho de papel, o tanque cheio d'água e alguns minutos de silêncio para eu dar a volta ao mundo. Hoje, me cobram R$2,10 para ir de um bairro ao outro.
A verdade é que eu nunca quis crescer e com isso aprendi a brincar de viver. E eu brinco tanto que nunca canso. Estou sempre com um sorriso no rosto, pronto para o que der e vier. É que eu guardei dentro de mim a criança, e dou vida a ela sempre que preciso. Quando está tudo ruim eu fecho os olhos, fico em silêncio, me escondo na minha mente, coloro meu dever de casa e imagino que tudo vai ficar bem. Pego meus lápis de cor e coloro o mundo, levo alegria a quem chora e arranco risada de quem queria chorar. Infantil? Não! Só a maturidade lhe permiti ser menor do que você é. E não há jeito melhor de crescer.
Ontem, eu olhei no espelho e vi a barba em meu rosto. Lembrei da primeira vez em que eu fiz a barba, aos sete anos e minha mãe me disse: "Você não tem barba, menino". Ontem, eu corri na sala sorrindo ao chorar e gritei: "Mãe, mãe. Eu tenho barba". Ela não entendeu. Mas eu vi, os cabelos brancos que hoje estão na cabeça dela, os cabelos que não mais estão na cabeça do meu pai e descobri que agora não posso mais correr para a cama deles quando eu tiver com medo. Vou ter que guardar um espaço na minha cama para quando eles tiverem medo.
Estava terminando este texto, quando minha mãe me gritou: "Menino, você vai se atrasar para o trabalho" e me entregou a marmita. Antes era a merendeira e eu ia para a escola... Pensando bem, não é a gente que cresce. É o mundo que muda de tamanho e esquece de nos avisar.

4 comentários:

  1. que doçura o teu texto.
    concordo quando diz que "dói crescer".

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Olá, Denise!... Boa-noite!

    Muito obrigado pela visita e pelo comentário, mas "a César o que é de César": o texto QUERO SER PEQUENO é de autoria de Ruleandson do Carmo, e não meu!

    Volte sempre e... um forte abraço!

    Joésio

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