quarta-feira, 13 de agosto de 2008

CRÔNICA DA SEMANA


ALFINETE

Nunca gostei de encher bola de festa. Ainda mais se for de cor cinza, como o céu deste domingo.
O gosto seco e a textura áspera do plástico que tocamos os lábios para fazer crescer o ornamento faz tudo começar mal. Boca sabe muito mais do que cabeça e sente mais que coração. Boca não gosta de sabor ruim, nem de beijo falso. Boca não engana. Quem engana passa por ela com medo de ser mordido.
Mas aí você ludibria o paladar e continua o serviço de inflar. Expira tão forte que parece que algo além de ar também saiu do pulmão. Isso pode assustar os mais analíticos, como eu. Qual equipamento define o que pode sair e entrar naquele momento? E se, nesse movimento, se for um pedacinho de mim? E se entrar um pedacinho de alguém?
Levei um tempo para aprender a dar o nó na bola. Na verdade, depois que aprendi, também fingi em muitos momentos que não sabia, só para evitar a prática. Exige rapidez e uma certa coragem. Depois de lacrado, o que tem ali dentro só sai se alguém estourar, quiçá com um alfinete.
Hoje, estou me sentindo como se tivesse enchido todas as bolas de festa do mundo.
Vazia.
Engraçado que isso acontece justamente após ter me sentindo, por muitos dias, cheia de si.
Todo mundo também é seu próprio alfinete.
Encosta a boca, dá o que tem dentro do corpo e da alma, vigia para que aquilo não escape, sela, pensa que vai durar a eternidade e depois, acaba estourando. E aí, parece que abriram a caixa de Pandora. Tudo se esvai com o vento e parece que nunca existiu, mas até pouco tempo tinha forma e cor, e até voava.
Tem que ter coragem para dar fim à uma bola dessas. E ouvidos protegidos. O barulho é tão silencioso que te aprisiona. Parece o som de uma eternidade meio calada.
Então falar me pareceu uma boa opção.
Alguém aí quer fazer festa?

(Fonte: www.cccblog.wordpress.com)

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